quarta-feira, 28 de março de 2007

A FACA E O HOMEM

Uma faca não é uma arma.
Como qualquer objecto do nosso quotidiano somos nós que determinamos, do modo como o usamos, a sua função.
As facas são um instrumento de trabalho e um utensílio fundamental para o nosso dia a dia, descoberto e usado desde a pré-história pelo homem.
Foi o ser humano que na sua luta diária pela sobrevivência, ao tentar encontrar algo na natureza que o auxiliasse na sua necessidade de preparar os alimentos, procurou á sua volta e encontrou uma pedra partida e aguçada que manuseada com a destreza que o distinguia dos demais animais servia os seus propósitos. Daí a começar ele próprio a fabricar os seus instrumentos de corte a partir de pedras que lascava, foi a evolução lógica do ser pensante e inventivo de que descendemos. A faca servia para tudo o que precisava no dia a dia, desde cortar frutos e vegetais para se alimentar, cortar os ramos e as folhas das arvores e arbustos para construir os seus abrigos, a casca destes para usar como protecção ao seu próprio corpo, para transformar nas suas mão hábeis em utensílios para transportar os seus parcos haveres. Servia para o auxiliar na caça de que dependia em grande parte para a sua alimentação e sobrevivência, para esfolar os animais de que se alimentava para lhes aproveitar a pele, para cortar a carne destes , para trabalhar os ossos e a madeira para fabricar novos utensílios, e todo um sem numero de necessidades no seu dia a dia.
Quando mais tarde aprendeu a recolher os metais e a os usar, a faca acompanhou essa evolução começando a ser fabricada em metal, passando pelo bronze e chegando ao ferro, que graças á evolução se transformou em aço pela adição de carbono e de outros componentes que lhe conferiam novas propriedades como dureza, tenacidade, flexibilidade, elasticidade e resistência á corrosão.
Tudo isto foi possível porque a par da faca, o homem dominou o fogo e aprendeu a usa-lo em muito mais que o simples aquecimento e para cozinhar os alimentos.
Usou-o para transformar o ferro em aço, para o tornar dúctil para que o pudesse moldar, mas também aprendeu a usar o fogo para lhe conferir durezas e outras características antes inimagináveis de conseguir de modo a que as facas cobrissem e satisfizessem todas as suas necessidades.
Nasceram os ferreiros, os homens que usavam o fogo para transformar o metal em instrumentos úteis e fundamentais ao dia a dia da humanidade, os depositários dos segredos dos metais e das técnicas ancestrais para o trabalhar.
A imagem do ferreiro não pode ser dissociada da figura do ser humano que usando somente os conhecimentos adquiridos, a sua perícia e a sua força muscular, de martelo bem firme nas suas robustas mãos, dominando o poder do fogo na sua forja e transformando o ferro em instrumentos e utensílios fundamentais para a vida dos homens.
É esta tradição que alguns de nós não querem deixar perder nem cair no esquecimento. É o remar contra a maré e a industrialização desenfreada, é o procurar manter viva a tradição, é procurar regressar ás origens, á optimização do instrumento faca, no âmago em que ele nos serve, procurando conferir-lhes as características que verdadeiramente importam e que em nome da massificação industrial foram preteridas muitas vezes pela estética e pelo uso de materiais menos nobres e de fraca qualidade. È o regressar ao objecto único, criado unidade a unidade e diferente de todos os outros, com alma própria e 100% adaptado e fabricado para a função, com a máxima simplicidade e qualidade que a destreza e o conhecimento ancestral permitem.